terça-feira, 28 de junho de 2011

R de Magistério

Olá. Existo há mais de meio século. Há 61 anos, para ser mais precisa. Sou forte, firme e maciça; luto pelo que quero, e acabo conseguindo. E ai de quem vier me confrontar. Vem...
Sou mulher vívida e vivida. Sou cheia daquilo que chamam de ‘caretice da 3ª idade’. Sou da 1ª e única idade: a de viver. Tenho plena consciência de que minha vida está chegando ao fim. E, quando eu partir, não quero todas aquelas aclamações à minha alma, que repousará num sono sublime e eterno na terra dos anjos.
Dizem que sou anjo. Vai ver sou. Nunca fiz nada pela nação; nem nunca vou fazer. E quero morrer assim: ajudando quem precisa passar de ano, no vestibular e vencer na vida. Ser alguém, sabe? Meus ajudados agradecem-me por tudo o que fiz. Mas, o que eu fiz?
O que, afinal, eu fiz de tão espetacular para estes adolescentes perdidos na geração globalizada, onde os obrigam a reverenciar um produto que, provavelmente, causará câncer amanhã? Apenas alertei-os, pedi para que deixassem de ser seres alienados e tão iludidos pelo capitalismo.
Eu grito mesmo. Digo o que penso, sem medo das consequências. Bato o pé, me estresso, mas não consigo ficar com as palavras entaladas na minha garganta, engolindo-as sempre, deixando pra lá. Há sempre pessoas nas quais lutam pelos mesmos ideais que eu. Quero ver quem é que vai lá e estufa o peito para se expressar. Eu vou. Apenas eu.
O mais engraçado é que, por mais que eu seja brigona, todos à minha volta me amam: família, amigos, professores, alunos. Todos veem em mim uma heroína. Não a heroína droga, mas a heroína que luta por uma nação. Pela nação? Não diria, não.  Acho que não chega a tanto.
Vergonha na cara. É isso que falta nos estudantes do século XXI. Como é que pode, há 20 anos o aluno ter de levantar de sua carteira para receber seu professor na sala de aula, e hoje o professor ter de implorar ao aluno, para que ele possa dar sua aula? É indignante. Mas, meu Deus do Céu, por que nada se faz com o aluno que ofende sua mãe na sua frente, para todo mundo ouvir? Sou muito mais velha que ele, exijo respeito máximo comigo e, principalmente, com minha família, que não tem nada a ver com a vida escolar de tal educando.
Estou passando por um momento muito especial e reflexivo em minha vida. Não tenho medo da morte. Encaro a morte como uma recompensa de todo meu esforço ainda em vida. Por isso é muito relativa; cada pessoa tem a morte que merece. Uns morrem de forma cruel, mas mereceram. Outros morrem dormindo. Estes viveram um longo acalanto. Seja como for, estarei bem, descansando ao lado de quem mais me ensinou durante estas – quase - sete décadas. Seja como for, sentir-me-ei como se estivesse em beira de praia, sentindo a brisa fina que acaricia meu rosto e canta a mais bela canção de ninar em meus ouvidos: “vá com Deus”. Eu sou Rosa, professora e mulher.

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